Maria Garrafada
MESTRA DO AMOR, PECADORA E SANTA
Autor: Manoel Monteiro
Membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel
-01- O século passado foi Rico em criar personagens Dos mais diversos matizes, Das mais típicas linhagens; Destacando, a lira arguta Vai render a uma puta As mais justas homenagens. | |
-02- CAMPINA GRANDE cresceu Graças a força empenhada Por forasteiros e filhos Desta terra tão amada, Dentre os nomes que se inscreve Um � quem CAMPINA deve É MARIA GARRAFADA. | |
-03- Todos deram ajuda GRANDE Para construir CAMPINA E MARIA GARRAFADA, Logo cedo, bem menina, Instalou próspero empório Que tinha como escritório As entranhas da vagina. | |
-04- MARIA foi tão somente MARIA só, e mais nada, Alquimista intuitiva Criou meizinha afamada, Que fabricava e vendia A qual deu-lhe o nome um dia De MARIA GARRAFADA. | |
-05- MARIA sem sobrenome Sem passado ou tradição, Sem procedência importante Sem orgulho ou ambição Sem apegos e sem laços Viveu de vender pedaços Do seu grande coração. | |
-06- Ela que mercadejava O amor por atacado Sabia os riscos que corre Quem vive nesse mercado Mesmo porque muitas vezes Viu alguns dos seus fregueses “Comprar produto” estragado. | |
-07- Antes da penicilina A pessoa “premiada” Com uma venérea estava Numa tremenda enrascada Da qual por vez não saia, Para ajudá-los, MARIA, Formulou a GARRAFADA. | |
-08- Ela que portava o mal Também ofertava a cura Não tinha culpa de ser Objeto de procura, Corria riscos constantes Igual, ou mais que os amantes Nessa vida de aventura. | |
-09- MARIA nos verdes anos Fez da profissão antiga Um sacerdócio e um bem, Afável, doce e amiga; Na idade matutina Doou-se inteira � CAMPINA Como prima-rapariga. | |
-10- No bordel de um leito só Era um vai-e-vem diário De gente importante e rica, Camponês e proletário, Velho fazendo mestrado E jovem pouco ilustrado Fazendo o curso primário. | |
-11- No Beco da Pororoca Instalou seu paraíso Aonde CAMPINA-homem Baixava, quando preciso, Na ânsia de conhecer Os mistérios do prazer O amor pleno e conciso. | |
-12- � Numa cama pobre e tosca Sob a luz bruxuleante Duma lamparina acesa Com sua chama ondulante Esfumaçava paixões De imberbes rapagões Nas mãos de MARIA amante. | |
-13- MARIA, corpo de louça, Olhos ternos, voz serena, Mãos de fada na carícia, Parceira de Madalena Nessa profissão sem nome A não ser que você some Nomes que vão a dezena. | |
-14- As prostitutas do mundo Muitos outros nomes têm: Um, Mulher da Vida Fácil Pois acham que vivem bem, Mas isso é pura besteira, Quer ver se a vida é maneira? Caia na vida também. | |
-15- Catraia, quenga, piranha É assim que o povo chama, Biscate, puta, rameira, Quebra-galho, mulher-dama, Mas sendo em sociedade Ganha nova identidade Pra ser Moça de Programa. | |
-16- A puta é como o palhaço Que jamais pode deixar Transparecer seus problemas Para não contrariar Os que querem diversão Mesmo porque a função Precisa continuar. | |
-17- MARIA igual a Maria Aquela da Palestina Também sofreu seus tormentos Mas sem maldizer a sina, Padeceu no paraíso, Se triste, fez-se em sorriso Pelas noites de CAMPINA. | |
-18- Foi namorada e amante, Conselheira e confidente De uma cidade inteira Rica de bens, mas carente De um corpo disponível Que aceitasse passível O desfrute permanente. | |
-19- MARIA dava de graça, Por muito, ou pouco dinheiro, Seu negócio era manter Os fregueses do puteiro Onde era Mestra e Doutora, Dona, serva e criadora Do comércio pioneiro. | |
-20- Numa ruazinha estreita MARIA fez o seu ninho Onde – vendia um “pedaço” do corpo – ou dava todinho, Alma, vida, coração, Mais amor, e mais paixão, Mais ternura e mais carinho. | |
-21- “Comprar” mulher não é coisa Que se chame novidade, Você “compra, paga e usa” Quando bem lhe dá vontade, “Come” e fica satisfeito Mas deixa do mesmo jeito Pra outra oportunidade. | |
-22- Desse-lhe um copo de vinho, Uma dose de licor Ou uma pequena cédula Do mais ínfimo valor Isso bastava a MARIA E ela retribuía Com uma taça de amor. | |
-23- Estava sempre ao dispor Quer de noite, quer de dia, Era só bater de leve Ela solícita atendia, Para a cidade carente MARIA literalmente Pernas e portas abria. | |
-24- Na alcova MARIA foi Passiva, ativa, instrutora, Recatada, libertina, Maternal e professora Por isso reconhecida MARIA foi nessa vida A mais Santa-pecadora. | |
-25- MARIA ensinou CAMPINA A arte da putaria, Moça cair na fuzarca, Rapaz “chupar” porcaria; Velho quando estava seco Era só passar no Beco E afogar-se em MARIA. | |
-26- Muitas damas da cidade Hoje matronas casadas, Com esposo/filhos, netos, Proles bem estruturadas; Não esquecem que um dia Foram da Mestra MARIA Alunas bem aplicadas. | |
-27- Estou relembrando isso Mas sem recriminação, Quem deu, se deu porque quis, Por amor, ou precisão, Deu uma coisa que dando, Não diminui, vai somando Prazer e satisfação. | |
-28- Também muitos cavalheiros Dos quais ninguém desconfia Freqüentando a Pororoca Forçaram na fantasia, Em noites de vinho e tara Findaram metendo a cara Entre as pernas de MARIA. | |
-29- Nesse caso eu digo o mesmo, Se fez e fez porque quis, Sem MARIA forçar muito A cara do infeliz Não vou condenar ninguém Pois cá pra nós, eu também Algumas besteiras fiz. | |
-30- Mesmo o passado só serve Para lembrar no futuro E aquilo que se deu Numa alcova ou quarto escuro Só aos dois interessa Sendo melhor que a conversa Jamais ultrapasse o muro. | |
-31- Homem vence touro brabo Mas a mulher o “derruba” Anotem, pois alguns nomes Dos que fizeram suruba Com MARIA GARRAFADA: - Seu Terto passou noitada Com Severo e Carnaúba. | |
-32- Francisco da Marinete, Carlos, dono do Abrigo Numa noite fraquejaram Igualzinho � seu Rodrigo Que ao lembrar-se do Beco Ficava engolindo em seco, Porque? Eu sei, mas não digo. | |
-33- Dr. William de Brito Ilustre cardiopata Numa noite de gandaia Bebeu que meiou a lata Depois caiu na orgia E lambeu tanto MARIA Que ficou de venta chata. | |
-34- O industrial Serginho Aquele da Tecelagem Era lambedor de fama E contava pabulagem; O Chefe da Estação Num concurso de chupão Ganhou com 10 de vantagem. | |
-35- Mesmo arriscando o pescoço De delatar eu não fujo Pois MARIA me contou Que o empresário Araújo Nas noites que a visitava Dificilmente escapava Sair de bigode sujo. | |
-36- Na lista dos lambe-lambe Estão Quirino e Lindolfo, Anézio, Mário e Luiz, Asdrúbal, Santos, Rodolfo, Tavares, Costinha, Paulo, Wanduy, Marquito, Saulo, José, Valdez e Sindolfo. | |
-37- Alfredo da Padaria, Tenório, Cícero, Cabral, Antunes que ajudava As missas da Catedral; Segundo contou MARIA A relação encheria Um caderno de jornal. | |
-38- Por favor, não vão sair Suspeitando de ninguém Porque os nomes acima São fictícios e quem Vai fazer o papel feio De mostrar o erro alheio Se tem seus erros também? | |
-39- Os nomes foram trocados Mas a história é real, O Beco da Pororoca Por décadas foi o local Onde se achava MARIA E a cidade fazia Repetido bacanal. | |
-40- Na Escola da Pororoca A estudantada via Uma oportunidade De aprender anatomia, MARIA ensinava tudo Era o compêndio de estudo Onde a moçada aprendia. | |
-41- Foi desgastando-se aos poucos De tanto ser folheada, Cada ruga que surgia Era uma folha rasgada, Chegando ao final do conto, Resta uma cruz, como ponto, De MARIA GARRAFADA. | |
-42- MARIA, jovem, vendia Beleza, lascívia e graça E quando passava enchia De brilho os olhos da praça Mas o tempo foi passando E MARIA foi ficando Como vitral que se embaça. | |
-43- Seus trejeitos sensuais, Seus meneios provocantes, Seu corpo de saciar A sede de mil amantes Dando amor e recebendo Aos poucos foi perdendo As belas formas de antes. | |
-44- MARIA, Santa MARIA Deu a cidade que amou Seu corpo em flor de menina Assim que desabrochou, Mas como tudo é furtivo, Um dia, assim, sem motivo MARIA inerte, murchou. | |
-45- CAMPINA sentindo falta Da puta mais festejada Mestra na arte sublime De dar prazer � moçada Por ser de pleno direito Queda-se rendendo um pleito A MARIA GARRAFADA. | |
-46- CAMPINA cidade obreira Feita por gente impoluta É GRANDE porque nasceu Com muito trabalho e luta De criadores, tropeiros, Filhos natos, forasteiros, Índio, branco, preto e puta. | |
-47- M – ÁRIA, estes versos são A – minha humilde oferenda N – ão devo esquecer que em vida O – teu corpo esteve � venda; E – ras Santa e dissoluta, L – inda, pecadora e puta, M – ULHER, mulher, rica prenda. |
Parabens ao site por divulgar o cordel sobre Maria Garrafada (uma das damas da noite mais famosa de nossa cidade do passado). No ciclo do algodão que aconteceu em nossa cidade atraia gente de todos os cantos do Brasil e do Mundo e a diversão desse pessoal era ir para os cabarés. Os bregas de antigamente os dias se transformavam em noites, estas em madrugadas. Quase todos os homens endinheirados freqüentavam os antigos cabarés da Rua Manoel Pereira de Araujo a famosa “Rua Boa”. Era compradores de algodão, engenheiros, advogados, autoridades em geral desfilando garbosamente nos salões de dança, atraz das damas e heroínas da noite (que não passavam de moças da roça ou meninas da cidade “que tinham se perdido”) . Antigamente a lei era dura: transou, não casou, vai para o cabaré. A presença desse pessoal endinheirado na “Zona” era uma festa. Com dinheiro no bolso, era “disputado” a tapa pelas raparigas.
Velho eu fiquei chocado com a variedade silábica sem falar no vocábulo, pois bem, eu escrevo cordel tenho um blog www.poetaalbertolima.blogspot.com
inclisive estarei postando uma resposta aos meu leitores que me questiona, -de onde você tirou tanta escrotidão pra escrever A MULHER QUE MATOU O MARIDO PARA AMENCEBAR COM O JUMENTO, exatamente , essa abordagem sinuoso porém direta é massa.
Sou de Salvador quanto estiver por aqui me ligue.
Abraço
Merecida homenagem!